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Cidade à deriva

  • Reportagem de Mateus Gomes
  • Jul 15, 2018
  • 7 min read

Do louvor à crucificação: Crivella não cumpre promessas de campanha e perde apoio de cariocas


Pesquisas apontam baixa popularidade do prefeito do Rio em 2018. Carnaval, religião, atual situação econômica da cidade podem ser alguns dos motivos para a rejeição.


Sofrendo com um déficit orçamentário herdado do prefeito anterior e com escândalos de corrupção envolvendo o governo estadual, o prefeito do Rio, Marcello Crivella, tem tentado trilhar um rumo diferente ao dos governos MDB, mas vem esbarrando em problemas econômicos e na posição conflituosa de figura religiosa — ainda que de licença — e ocupante de um cargo público; nada menos do que o chefe do executivo municipal. Após completar um ano de mandato, Crivella (PRB) perdeu consideravelmente o pouco apoio popular que tinha.


Segundo pesquisa de opinião realizada pelo Instituto Datafolha em março deste ano, a gestão de Marcelo Crivella na Prefeitura do Rio de Janeiro foi reprovada pela maioria (58%) dos moradores da cidade, que a considera ruim ou péssima. A aprovação foi de apenas 10% que a avaliam o governo como ótimo ou bom. O índice chega a ser menor do que a aprovação ao governo Dilma Rousseff (13%) na última pesquisa também do Datafolha antes do impeachment da ex-presidente. Os demais consideraram o governo Crivella regular (30%) ou não tiveram opinião a respeito (2%).


Em outubro do ano passado, 40% reprovavam o governo de Crivella, índice que passou para 61% em levantamento realizado na primeira quinzena de março deste ano e, posteriormente, teve leve recuo. O índice de aprovação no mesmo período passou de 16% em outubro para 9% na primeira quinzena de março. Posteriormente, registrou índice similar. De 0 a 10, a nota média atribuída ao desempenho de Crivella à frente da prefeitura foi de 3,5 no fim de março, abaixo de outubro do ano passado (4,5).


Em um período de menos de 6 meses, o prefeito apresentou queda de popularidade. Isso, em números, é expresso no aumento de 18% da reprovação ao seu governo, na diminuição da taxa dos que aprovam, com 7% a menos, e com a perda de 1 ponto na nota média de desempenho.

pesquisa aprovação prefeito

Situação econômica


O Rio de Janeiro vem passando por uma grave crise financeira nos últimos anos, principalmente a partir de 2014, com a queda dos preços do petróleo, importante fonte de receita do Estado, a crise na Petrobras e a maré econômica que todo o país enfrenta nos últimos anos. Como resultado, as filas de desempregados aumentaram. Em 2017, o Rio fechou o segundo trimestre com índice de 15,6%, o maior dos últimos anos, segundo dados do IBGE. Protestos de servidores públicos com salários atrasados, hospitais fechados por falta de recursos e viaturas da polícia paradas, sem combustível, passaram a fazer parte da realidade da cidade.


Com uma herança de déficit de R$ 4 bilhões que teria sido deixada pelo governo anterior e diante de um contexto em que, segundo o governo estadual e a Lei Orçamentária anual, previu déficits de R$ 20 bilhões e R$ 10 bilhões para 2017 e 2018, respectivamente, Crivella tem tentado fazer um governo de austeridade fiscal ao diminuir gastos da máquina pública. No entanto, também lida com dificuldades nesse campo. O especialista em Ciência Política Guilherme Carvalhido considera que a economia tem papel fundamental na avaliação de governos impopulares. Para ele, quando a economia vai mal, a política também vai mal.


Alguns especialistas em economia se arriscam a afirmar que as dificuldades vieram à tona não apenas pela queda na arrecadação ou pela necessidade de cobrir despesas de projetos iniciados pelo antecessor Eduardo Paes, mas também por erros de gestão. Pode ser destacado como um dos principais motivos desse quadro de dificuldades financeiras uma menor arrecadação do ISS, o Imposto Sobre Serviços, receita frustrada por conta da crise econômica. Dos R$ 6,3 bilhões previstos, só entraram R$ 5 bilhões.

prefeito do Rio e as religiões

Eleições


Uma das hipóteses dos números ruins em relação à imagem do prefeito e do seu governo é a configuração “atípica” do resultado das eleições para a prefeitura em 2016, afirma Carvalhido. Para o cientista político, a superioridade da quantidade de votos nulos, brancos e abstenções associada a uma forte rejeição ao candidato oposicionista Marcelo Freixo indicam que já havia uma rejeição prévia ao atual prefeito. “Ele foi eleito com pouca representatividade, com menos votos em relação aqueles que não queriam votar em ninguém, então já foi uma entrada complicada, um contexto difícil para ele”.

Guilherme Carvalhido

Guilherme Carvalhido, cientista político e professor de Marketing Político / TV UVA Notícias


De acordo com os resultados apresentados pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) das eleições apuradas de 2016, os votos brancos, nulos e as abstenções representaram um percentual de 41,53% do colégio eleitoral (2.034.352 votos), acima do percentual de votos em Crivella nas eleições que, embora tenha recebido 59,36% dos votos válidos, diante de todo o colégio eleitoral somou 1.700.030 votos (34,70%).


Traçando-se um paralelo maior com o resultado das eleições, é possível identificar que perfis contrários a Marcelo Crivella tiveram uma acentuação da rejeição e que, até mesmo nos perfis favoráveis, o descrédito do prefeito era grande e se mostrou crescente.


Nas regiões onde o deputado Marcelo Freixo (PSOL) ganhou de Crivella nas eleições, os índices de reprovação ficaram acima da média. Na Zona Sul, incluindo a região da Tijuca, 76% reprovam a gestão de Crivella, enquanto que, no Centro, 69% também consideram o governo ruim ou péssimo. Por outro lado, nas zonas Oeste e Norte, onde se teve ampla vantagem para a eleição do prefeito, sua taxa de reprovação fica abaixo da média geral (50% e 53%, respectivamente), mas ainda assim pode ser considerada alta.

Religião


Em outubro, a aprovação entre evangélicos era de 31%, impulsionada pela aprovação dos evangélicos neopentecostais (mais alinhados religiosamente a Crivella), dos quais 45% consideravam o governo bom ou ótimo. A reprovação era de 22%, a menor dentre as categorias religiosas. Já na última pesquisa, a menor taxa de reprovação à atual gestão da cidade foi também verificada entre os evangélicos, mas com 13 pontos percentuais a mais (35%), segmento no qual apenas 22% a aprovam. Entre todos os outros grupos religiosos e não religiosos, a aprovação de Crivella mais recente foi igual ou menor a 8%, enquanto que as taxas de reprovação foram maiores ou igual a 65%.


O cientista político Guilherme Carvalhido também entende que a rejeição ao governo Crivella seja, principalmente, uma consequência do posicionamento religioso do prefeito. Para ele, isso tem interferido na atuação política do prefeito e refletido negativamente na opinião pública. “Isso ficou muito claro no Carnaval e foi midiaticamente apresentado que ele, numa cidade como o Rio de Janeiro, em que o Carnaval tem uma forte representatividade simbólica e econômica, numa questão de não gostar do Carnaval por ser religioso, se afastou do evento e reforçou uma imagem ruim, inclusive com a imprensa que já era contrária a ele”, explica o cientista.


Em contrapartida, há eleitores que acreditam que o fato do prefeito participar ou não do carnaval não interfere no compromisso que Crivella tem com a cidade. Para a estudante universitária e membro da Igreja Universal do Reino de Deus Alana Luiza da Silva Santos, de 20 anos, existem problemas maiores do que a decisão de Crivella ir ou não à festa, como o investimento público que é feito no evento. “É um absurdo o tanto de dinheiro que a gente tira do nosso bolso para o carnaval, enquanto a festa é patrocinada por inúmeras empresas privadas que têm o recurso de suster o que as escolas precisam. O evento pode até movimentar o turismo e ser o carro-forte do Rio de Janeiro, mas ele por sua grandeza já consegue se sustentar”, comenta a estudante.


Para quem não lembra, na ocasião, Crivella defendeu a realização de grandes eventos na cidade com recursos majoritariamente privados. O prefeito acredita que, assim como o réveillon, o carnaval precisa se tornar menos dependente da verba do poder público. Ele afirmou que assumiu a Prefeitura do Rio com um déficit orçamentário de R$ 4 bilhões e, naquele momento, não seria favorável investir verba pública no evento, já que a prefeitura pagou R$ 1 bilhão em juros das dívidas do município em 2017 e que, para 2018, era previsto o pagamento de mais R$ 1,2 bilhão.


Em entrevista à revista "Época", Crivella contou que apesar de não concordar com o excesso de dinheiro no evento, os gastos necessários para atender à demanda da festa foram pagos em dia. “Não sou como o Eduardo Paes, que era um carnavalesco. Sou evangélico, nunca fui de carnaval. Não tem a ver com o meu meio. Mas a festa teve as despesas pagas, ambulância, Comlurb e patrocínio, assim como aconteceu com o Rock in Rio. Eles correram atrás. Mas eu não vou desfilar, soaria falso. Não obrigo ninguém a ser como eu. Assim como não quero que me obriguem a ser como não sou”, declarou.


Vale lembrar que não só o carnaval perdeu investimentos da prefeitura. Alguns eventos tradicionais como a Parada Gay e a procissão em homenagem a Iemanjá também ficaram sem recursos.


Promessas


Em seu plano de governo, o prefeito Marcelo Crivella enumerou 50 promessas a serem concretizadas no decorrer do mandato. Das 50 promessas, 28 (54%) tinham como prazo o final de 2017. Destas, tendo como base informações expostas em nota emitida pela assessoria da prefeitura no início deste ano e a apuração da reportagem, o prefeito teria cumprido menos da metade no ano passado, ou 12 promessas (42,85%), concluiu 8 em parte (28,57%) e descumprido outras 8 (28,57%).


Cenário de promessas 2017-2020

28 promessas (54%) das 50 foram direcionadas ao primeiro ano

Até 2017: Cumpriu: 12 (42,85%) Em Parte: 8 (28,57%) Descumpridos: 8 (28,57%) Até 2018: 7 Até 2019: 5 Até 2020: 9 Até 2024: 1

As 50 propostas de Crivella e as realizações até o início de 2018


Programa do Governo Crivella

É difícil apontar melhorias nos serviços prestados ao cidadão, quando há muitos cortes e poucas realizações oriundas de investimentos. Algumas das propostas cumpridas por Crivella não dizem respeito a uma obra ou disponibilização de um serviço para a população, sendo na verdade rupturas do processo de gastos desempenhados no governo anterior, a exemplo da redução de secretarias, o corte de verbas de gratificações para servidores e a redução de cerca de 3 mil para 1.500 o número de cargos comissionados.


Antes mesmo da crescente desaprovação do governo Crivella, ainda em outubro do ano passado, os números sobre o atendimento às expectativas proporcionado pelo governo já eram bastante pessimistas, de acordo com levantamento do Datafolha: para a maioria (71%) dos cariocas que avaliaram o prefeito nos primeiros nove meses de governo, ele fez menos pela cidade do que era esperado. Para 16%, ele fez o mesmo do que o que era esperado e, para 7%, fez mais do que o esperado.


Dos que votaram no atual prefeito, 61% consideravam seu desempenho na gestão da cidade abaixo da expectativa, 21% a consideraram dentro da expectativa e, para 13%, está acima da expectativa. Na parcela que votou em Freixo, 79% veem as realizações pela cidade até o momento como abaixo do que esperavam, 12% acreditam que está dentro do esperado, e apenas 1% avalia que está acima do que esperavam.


As promessas não foram muitas e, ainda assim, a prefeitura não conseguiu cumprir satisfatoriamente os compromissos. Restará agora ao prefeito Crivella correr contra o tempo para fazer o que precisa ser feito, melhorar a sua imagem caso queira tentar a reeleição e, principalmente, deixar uma boa herança.

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