top of page

Espírito de corpo fechado

  • Sérgio Bandeira de Mello, Gico
  • Mar 23, 2018
  • 3 min read

Caprichoso e Garantista, Ministros do Supremo

O supremo barraco de ontem guarda alguns mistérios na estridente dissonância, mas seus robustos alicerces cristalinos remontam ao império, senão à colônia, por herança. Reforçados nas repúblicas velha e nova, trata-se da estrutura sobre a qual conseguem repousar em berço esplêndido os mais apodrecidos contraditórios, processos consensualmente condenados à prescrição mediante fortunas absorvidas em honorários, infortúnio público que sangra dupla e eternamente o Erário. Mas exploremos o barraco aberto, com a mente e o pulmão abertos aos ares mais irrespiráveis do País.

Nem sempre onde há fumaça há fogo, e gelo seco é o exemplo mais comum. Contudo não é o caso, pois o descarrego original aconteceu na Bahia, estado sólido pouco dado a silêncios e monossílabos para abastecer a universal multimídia bairrista.

Decerto a esfumaçada notícia passara batida pelos jornais do Rio por causa da bárbara execução da vereadora e seu motorista, matéria bem mais importante, mas as redes sociais e os jornais paulistas encarregaram-se da divulgação da esotérica agenda de Lula no fórum social realizado em Salvador.

Precisamente há uma semana, na quinta-feira15 de março, o multirréu condenado a 12 anos e uns quebrados de cadeia teve seu corpo fechado em uma cerimônia ritual indígena, cujo intuito seria manter o apenado ainda solto sob proteção silvícola, onde enxergo uma embaçada FUNAI às avessas.

Será que isso não constituiu uma piada de mau gosto, programa de índio a que o Nove Dedos foi obrigado a se submeter pra ficar bem na foto? Afinal, fechar o corpo de um cristão que está prestes a ir pra tranca não seria antecipação da pena? Ademais, sempre soube que o verdadeiro índio não gosta de fotos por lhe levar a alma, mas será que a crença resiste à era digital, sem negativos? Sim, não houve negativas por parte de nenhuma das 20 etnias, tanto que as imagens foram autorizadas, captadas e distribuídas pelo próprio fotógrafo do Instituto Lula.

Por outro lado dos pajés, durante a pajelança costumeira realizada ontem, os ministros acovardados rodaram a baiana contra a presidente da casa. Não relutariam em fazer vigília contra a ordem de prisão, que poderia ser expedida a partir de 26 de março próximo se a pauta não fosse atacada a golpes de borduna e latim. Na pele de monocráticos, alguns fazem qualquer negócio, menos beijar na boca. Só que não.

Os marqueteiros baianos, insuperáveis em criatividade graças às lavagens das escadarias da Conceição, do Bonfim e das contas em dólares no exterior, imortalizados pelos escândalos do Mensalão e do Petrolão, devem batizar a iniciativa indígeno-sindical de quem roubou “do poço ao posto” de “da tanga à toga”. O genial slogan faz alusão à união daquele índio que errou primeiro, com o outro Cabral, até o ministro que pode errar por último na garantia dos direitos constitucionais dos colarinhos brancos, fontes inesgotáveis de recursos naturais que, ao contrário dos rios, correm para cima. Correm? Arrastam-se em lentos e sucessivos meandros até o planalto central.

Fato é que, no Fórum Social de Salvador, Lula não foi defumado com charutos cubanos da marca Cohiba, como costumava ser nas rodas bolivarianas patrocinadas pela Odebrecht, empresa igualmente baiana que, ontem, fez mais uma perseguida vítima, ao promover o divórcio entre PPK e o Peru.

Rachada, a sessão plenária para apreciação do ritual de proteção do Judiciário bombou. Saiu fumaça e, mais uma vez, não houve fogo, a não ser cruzado.

Paralisada pelo embate supremo, Brasília lembrou as melhores tradições de Parintins, e teve seu ápice no bumba meu boi em plenário entre o chifrudo Garantista, boi encarnado de todo mal com pitadas de psicopatia, e Caprichoso, que desembestou com marradas para cima do rival. O ruminante de boca mole, em revide, sugeriu que o opositor tivesse o capricho de fechar o seu escritório de advocacia. Meus Deus! Que Tupã seja louvado! Onde restará o único consenso?

Como enquanto houver bambu vai flecha, o que importa é que as necessárias demarcações das privilegiadas terras férteis onde ambos pisam e plantam jamais serão violadas; que os alicerces do barraco jamais serão destruídos, razão pela qual serão capazes de sustentar gerações e gerações de advogados protegidos pela OAB, a FUNAI dos medalhões. Tanto que ontem, uma vez serenados os ânimos no show do intervalo, incorporada na viva voz de um associado, a Ordem, instituição que zela pelo fechado espírito de corpo, pediu vênia para pautar a salvação de seus arrimos de colarinhos brancos.

bottom of page