É preciso olhar para a nossa imagem na foto
- Jason Prado - DP
- Nov 22, 2017
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Triste constatação: a elite brasileira se parece muito mais com “tomadores de conta” do que com os proprietários do negócio. Somos uma sociedade de “Capitães do Mato”; de “Feitores”.
Ninguém faz planos de longa duração. Tanto faz o rumo das coisas para os que estão no alto, o tamanho da crise, a iniquidade. Desde que a sua parte, seu quinhão pessoal, seu micro feudo, não seja tocado.
Esse foi o projeto de ocupação feito por D. Manoel para o Brasil. E parece continuar sendo a mesma coisa até os dias de hoje, apesar de termos nos tornado uma república independente há muito tempo. Somos um país formado por nobres do terceiro e quarto escalão, "fidalgos" a quem se garantia o direito divino de não trabalhar.
E o Rio de Janeiro é a encarnação desse espírito, o estado da arte da malandragem e da esperteza.
Um amigo lembrava, ontem, da caricatura que Walt Disney fez dos cariocas, quando esteve aqui nos início dos anos 40 do século passado. Impressionado com o “jeitinho” do brasileiro, ele criou o Zé Carioca, um personagem escorregadio, preguiçoso, eterno endividado e dependente de sua namorada. Curiosamente chamada de Rosinha, mas sem nenhum parentesco com aquela que conhecemos na vida real - e que, no lugar de emprestar, tomou emprestado dos "manés" cariocas.
Passados quase oitenta anos, essa ainda é a imagem que predomina no imaginário da humanidade e sobre todos nós. Uma sina, uma maldição que se abateu sobre a nossa sociedade.
Falávamos, é claro, à propósito do trivial: a crise brasileira, a crise fluminense, vários buracos abaixo da primeira, e a crise moral de nossas elites política (desavergonhada), econômica (acumpliciada) e social (omissa).
Em qualquer outro lugar do mundo já teriam tomado e fechado a Assembleia Legislativa.
Diante desse escândalo da Fetranspor, teriam encampado os ônibus e estatizado os transportes públicos.
Depois de tantos governantes presos, teriam moralizado o serviço público. Esses corruptos pediriam para ser presos por medida de cautela e segurança. Minimamente, viveríamos uma desobediência civil, com a parte saudável da sociedade deixando de pagar impostos enquanto houvesse vestígio de qualquer fraude com o erário.
E o que se vê? Nada! Tudo transcorre como se absolutamente nada de anormal estivesse acontecendo.
Depois da escandalosa reação corporativista dos nossos deputados na última sexta-feira, de seu açodamento para libertar seus pares, o sábado foi um dia normal. Quem gosta e pode, foi à praia. E o domingo foi dia de Parada Gay.
Tirando um ou outro texto excepcional como o do Fernando Gabeira neste final de semana, nada mais aconteceu na ordem política e social.
Eu confessava àquele amigo citado o meu desencanto com toda a minha geração, que desbundou com o fim da ditadura no final dos anos setenta, e deixou a coisa desandar a partir de então. Como nos omitimos quando víamos tipos como Paulo Maluf, Orestes Quércia, Jader Barbalho, Antônio Carlos Magalhães, Renan Calheiros, José Sarney, Anthony Garotinho, Severino Cavalcanti e tantos outros desqualificados ascender e incrustar no poder.
É por nossa ação e omissão que os Representantes do Povo já não nos representam.
Ou alguém se sente representado pelos ilustres ocupantes da Alerj, da Câmara e do Senado? A quem continua representando o Aécio Neves, por exemplo. Ou o Jorge Picciani? Será que algum deles reuniria 50 mil pessoas numa praça para justificar as cadeiras que ocupam? Será que eles reuniriam 50 mil assinaturas num abaixo assinado?
Fomos nós que permitimos que os poderes da República foram sequestrados por malandros “ishpertos”. Fomos nós que cedemos espaço para que Ministérios e Secretarias fossem leiloados entre gente desqualificada, ungida por votos, como se votos fossem o Santo Graal.
Aí está o resultado: não se passa um único dia sem que surjam dezenas de casos de fraude, desvio e corrupção. Nada está imune. Até com defuntos já se descobriu corrupção no Rio de Janeiro, envolvendo vereadores e agentes públicos.
Quando a sociedade vai acordar e partir pra dentro, tomar posição e exigir uma mudança de postura com essa corja de bandidos? Até quando vamos fingir que está tudo bem? Que a próxima eleição vai resolver todos os problemas? Ou a sociedade espera novamente pelos salvadores da pátria?
Voltando àquele amigo, que a prudência diz para manter no anonimato, mas que é bom que se cite o seu doutorado em Ciências Sociais. Lembrava ele que, sem o sangue das ruas, nenhuma sociedade consegue romper de fato com seus costumes. Principalmente aqueles que beneficiam as elites. No nosso caso, os Capitães do Mato.