E se você encontrar um Zumbi?
- Jason Prado, DP
- Jun 3, 2017
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Uns dez anos atrás, baixei um jogo no computador e fui completamente abduzido. Eu e metade da humanidade tivemos nossos cérebros literalmente devorados em horas e horas de um joguinho sem pé nem cabeça, chamado Plantas Vs Zumbis.
Desde então o tema vem crescendo na indústria do entretenimento, e não consigo sequer contar os títulos que tomaram conta das telinhas e telonas, em produções como Walkig Dead, Eu sou a lenda, Resident Evil, A guerra mundial Z, Padre…
O apocalipse - e, mais especificamente, o pós guerra nuclear - vem ocupando o imaginário desde que Francis Ford Coppola nos mostrou o lado bestial da guerra, em sua versão com esse título. De lá para cá, as produções foram apenas se diversificando e multiplicando. O cavernoso personagem de Marlon Brando, o Coronel Kurtz, inspirou dezenas de produções como Mad Max, Fuga de Nova Iorque, O livro de Eli.
Talvez a previsão de Albert Einstein (segundo ele a quarta guerra mundial será lutada com paus e pedras), tenha sido a origem dessas hordas de sobreviventes deformados, se reorganizando em torno das sobras da civilização.
Mas isso não explicaria o aparecimento dos zumbis, ao pé-da-letra mortos-vivos, desprovidos de qualquer vontade além de alimentar um metabolismo inexistente (afinal, estão mortos) com carne humana.
Zumbis estão na moda, como um dia já estiveram os caubóis, os nazistas, as aberrações radioativas e os alienígenas. Os jogos eletrônicos mais populares tratam disso. Até o Pentágono, segundo a CNN, tem planos para um apocalipse zumbi.
A simbolismo deste zumbi moderno é interessante. Ao fingir que se alimenta dos vivos, o zumbi retira do outro aquilo que já não possui, não quer e nem necessita: a vida.
Essa vida, que já foi “alma” sob o império da cruz, é metáfora de consciência, de ego, de vontade e, em última instância, de liberdade. Zumbis são prisioneiros na imortalidade.
Como não têm qualquer discernimento para além de seu mórbido desejo, eles não falam e, portanto, não produzem (esse é o viés ideológico), nem se agregam.
Mas se multiplicam. Não pela comunhão do sexo e a troca de gens, mas pela troca de secreções abjetas, como a baba em contraposição ao beijo (osculum, em latim), e o soro de suas carnes putrefatas, que toma emprestado à lepra, em contraposição à luxúria, ao desejo carnal.
Cada mordido é um novo zumbi. E, o mais curioso, são unidos pelo mesmo objetivo. Zumbis não atacam zumbis.
Na natureza alguns seres como formigas são transformados em zumbis por fungos, tornando o tema absoluta ente plausível.
Cabe a pergunta: por que a indústria do entretenimento adotou esse tema nas últimas décadas? Pura falta de assunto? Poderia ser apenas influência do bem sucedido álbum Thriller (mais de 100 milhões de cópias), de Michael Jackson?
A Engenharia Genética talvez seja a grande responsável. E a pequena Dolly - quem se lembra? - poderia ser o marco divisório do tema, substituindo as tribos pintadas, descendentes do Coronel Kurtz, pelas estranhas criaturas da noite e das sombras.
Ao desvendar o segredo de muitas doenças, produzir remédios que prolongam a vida, e avançar sobre os sintomas do envelhecimento, a medicina criou, no fim do século XX, um novo tipo de ser humano: o que não morre.
Não cabe aqui falar sobre os espectros que andam por aí com o sorriso enrijecido por toxina butolínica, nem sobre os que vegetam ligados a aparelhos, deitados ou em cadeiras de rodas. Mas o fato é que, ao mesmo tempo que traz alívio para as angústias da velhice e da morte iminente, essas conquistas trazem incertezas (e renovadas angústias) sobre a qualidade da sobrevida ao alcance de quem pode comprá-la - o que está em questão, objetivamente, é a consciência, a vontade e, em última instância, a liberdade.
Do ponto de vista ideológico, enquanto as telas se recheiam de mutantes, a imprensa assombra o mundo com máquinas devorando empregos, e seres improdutivos (os aposentados, que insistem em não morrer) roubando energia do sistema produtivo.
É um prato cheio para a arte do entretenimento.
Por isso os zumbis só conseguem ser combatidos (e abatidos) por aqueles que lutam obstinados, impondo regras em um universo caótico, até o extremo de suas forças, professando fé na humanidade.
Ou por cândidas plantinhas, que combatem o mal com suas sementes do bem.